Quem lê o blog, ou me conhece pessoalmente, sabe o quão pouco afeito a regras eu sou. Pelo contrário, sou um pediatra que briga contra as regras que medicalizam a vida ou transformam todo o cuidar dos filhos em uma questão de saúde. Mas, existe um tema ou assunto com o qual eu mantenho uma relação que beira ao transtorno obsessivo compulsivo! E esse tema é o da segurança das crianças. Já escrevi sobre esse tema no blog, mais de uma vez. Retorno ao tema pela sua importância e, aproveitando a divulgação que um acidente com um berço está tendo na mídia.
Para começar, explico a razão do meu TOC com segurança. Uma das formas de tomarmos decisões é a de anteciparmos as diversas consequências e nos perguntarmos se estamos em condições de lidar com as que podem ocorrer diante do pior cenário possível. Explico: o que pode acontecer se um bebê de 6 meses provar o sorvete que sua mãe está tomando? Desde nada (melhor cenário), até um vômito ou diarréia (pior cenário). O pior cenário, neste caso, não é algo que os pais, eventualmente, seriam capazes de enfrentar, tranquilamente. No caso de acidentes, o pior cenário pode ser algo insuportável, para o resto da vida dos pais. Portanto, na minha visão (que não é a verdade, apenas é a minha), acidentes possuem um potencial de um pior cenário insuportável, muito grande. Daí minha insistência com o tema.
Os pais que me conhecem sabem que eu repito as duas frases que sempre ouço quando um acidente doméstico ocorre:
- eu nunca imaginei que …..
- foi em um segundo!
De fato, não nos damos conta, que os bebês e as crianças são seres em constante e rápida evolução. A cada dia, hora ou minuto, amadurecem circuitos neuro-motores, conquistando habilidades e aptidões que, no momento anterior, não tinham. Por exemplo, um dia, sem aviso prévio, sem data e hora marcada, rolam! Quando isso acontece no berço ou no chão, os pais vibram de alegria. Mas, quando acontece na hora da troca de fraldas, e a mãe se virou para pegar a pomada, o risco de um bebê cair é enorme. E, se cair, uma vez passado o susto, a mãe dirá as duas frases acima: eu nunca imaginei que iria virar (nunca tinha virado antes!) e aconteceu em um segundo, eu só me virei para pegar a pomada!
O aprendizado é que devemos pensar o inimaginável, quando se trata de segurança. É difícil pensar e ficarmos atento ao fato de que uma nova aptidão ou competência motora pode produzir um acidente. Ficar em pé no berço, se debruçar e cair. Puxar um fio de lâmpada. Subir e/ouarrastar cadeiras. Escalar armários. Abrir armários e embalagens. A lista é imensa porque a capacidade criativa das crianças é ilimitada e sua curiosidade exploratória, imensa. À medida que a criança ganha mais mobilidade, engatinhando ou andando, o universo de possibilidades de “aventuras” é inesgotável. A solução? A primeira medida é prevenir! Prevenir, imaginando o impensável e, agindo assim que pensar. Pensou que pode pegar material de limpeza no armário? Mude de lugar na hora. Não adie! Pensou que poderá ficar de pé no berço? Abaixe o berço, na hora, não adie! A segunda, dá o título ao post de hoje: eterna vigilância! Criar novos reflexos nos nosso cérebros. Não deixar uma criança no banho um segundo para atender o telefone. Não sair para fechar uma torneira do tanque ou se virar para tirar algo do microondas, com panelas no fogo. Não ir até a porta, um minuto, receber uma encomenda, deixando a criança desacompanhada. Para ajudar a criarmos esse reflexo, é precioso pensar, todos os dias, que nossos filhos vão aprender algo novo, hoje! Não sabemos o que é, nem a que horas isso vai acontecer. As crianças não nos avisam: amanhã, vou começar a engatinhar, terça, às 10h, vou andar! Mas, vai acontecer e é desejável que ocorra. Só precisamos prevenir que não ocorra em lugar ou situação que traga risco para a criança.
Além destas situações, mais domiciliares, existem os cuidados que devemos oferecer aos nossos filhos, em termos de equipamentos de proteção: cadeirinha do carro, capacete sempre que andar de bicicleta (mesmo bebê e o adulto também usando), capacete, joelheira e cotoveleira para praticar skate, colete salva vidas quando andar de barco etc.
Um capítulo da segurança importante é o da prevenção do asfixia por alimentos. Evitar dar alimentos duros e pequenos (amendoins, pipocas, balas etc.) para crianças que ainda não tenham a dentição completa e estejam absolutamente confortáveis com a mastigação. Mesmo para estas, não dar alimentos em veículos em movimento. Evitar jogar o alimento na boca da criança ou até mesmo os pais comerem (amendoins) jogando para o alto e pegando na boca. A criança vai imitar o adulto, com risco de engasgar. Ainda no capítulo da asfixia, devemos ter cuidado com brinquedos, pequenas peças, tampas de caneta (aquela tampinha de trás da caneta esferográfica). Devemos puxar os olhos das bonecas, os botões dos pijamas dos ursos, para testar se estão firmes ou se há algum risco de se soltarem. Lembrem-se de imaginar o inimaginável (eu nunca imaginei que aquela tampa pudesse sair!).
Este é um post curto, de um assunto sério. Os exemplos que dei, são meros exemplos. O importante é o conceito de que segurança exige nossa eterna vigilância.Talvez seja o único assunto em que me verão escrever (e falar) de forma tão enérgica, rígida, quase autoritária. Estou convencido de que o pior cenário, em acidentes, é insuportável para qualquer mãe e pai. Valem todos os cuidados para que possamos não passar por isso.
4 comentários em “SEGURANÇA: A ETERNA VIGILÂNCIA!”
Muito bom!!! Para refletir e acionar!!! Muito obrigada
Corina,
Volte sempre ao blog.
Conheci o blog agora é já virei sua fã, não canso de ler cada publicação…Parabéns, uma sensibilidade que sinto falta hj nas pessoas, que estão tão cheias de regras, métodos, cursos…enfim…obrigada por dividir sua com a gente, a clareza e inteligencia em suas publicações
Rachel, obrigado por suas palavras gentis. Fico muito feliz quando o que eu escrevo possa ser de alguma utilidade para outra pessoa.